Durante escassos dois dias, fiquei hospedado com a minha esposa no complexo que o INATEL possui na Foz do Arelho. Contrariando o calendário, a primavera não sorriu a despeito de estarmos em abril. Fomos recebidos com chuva, forte ventania e algum frio. Felizmente que o alojamento e todo o serviço de apoio se revelaram bastante bons o que nos possibilitou uma estada assaz prazenteira.
Arredadas todas as hipóteses de fruirmos das banhocas nas águas calmas da Lagoa de Óbidos, restou-nos a paisagem para relancear os olhares. A curiosidade levou-nos a procurar uma anunciada estrutura em paliçada que existiria nesta zona. Instigados pela aprazível memória da paliçada do Paiva (Arouca), com estafantes mas deslumbrantes dez quilómetros, lá a conseguimos encontrar. É certo que fica um pouco distante do alojamento e da lagoa mas valeu a pena. Terá talvez um quilómetro de extensão mas está muito bem arranjada, facultando agradáveis espaços de descanso e permitindo observar a braveza do oceano e a costa alcandorada. À volta, a vegetação era toda rasteira devido aos ventos típicos do litoral. Alguns caniços, chorões, urzes já floridas e espécies resistentes à salinidade animavam a paisagem. Todavia, o que saltava à vista eram as toiças com esguias hastes em cujo cimo resplandeciam as flores das armérias que os nossos irmãos galegos denominam, muito justamente, “hierbas-de-namorar”. De facto, se outra serventia não tivessem, só de as olharmos, alegramos o espírito e faculta-nos boa disposição, tal a sua beleza. Logo pensei, ora aqui está uma planta que é medicinal porque nos regala a vista e fortalece a alma.
A arméria marítima, cravo-do-mar, ou estancadeira, como também é conhecida, tem a designação científica de Armeria maritima (atenção: sem acentos pois os mesmos não existem no latim) e pertence à família botânica das Plumbaginaceae. Há muitas dezenas de armérias e várias espécies híbridas. Julga-se que algumas subespécies são endémicas do litoral atlântico europeu, concretamente a rouyana e a pungens.
A arméria é uma planta vivaz muito resistente. Possui raízes fortes formando densos montículos que podem chegar a 50 cm de diâmetro. As suas folhas são verdes escuras e lineares, quase agulhas. Na primavera brota um espigão rígido que pode alcançar 10 cm de altura no cimo do qual aparece a encantadora inflorescência, uma cabecinha composta de pequenas flores cor-de-rosa pálido mas que também podem ser brancas ou lilases. Cada flor tem cinco pétalas com pistilos amarelados e é envolvida por brácteas secas com grande durabilidade que fazem lembrar papel. A polinização é entomógama, ou seja, resulta da atividade dos insetos. As sementes estão encerradas numa cápsula. A planta reproduz-se por sementes ou preferentemente por estacas que se separam da toiça mãe.
A arméria não pode medrar à sombra já que o sol é vital para o seu desenvolvimento. Em contrapartida, tolera a seca e a exposição marítima e resiste bem aos incêndios.
A flor é considerada, nos países anglófonos, o símbolo da simpatia. A moeda de três pence que vigorou outrora no Reino Unido tinha, no seu reverso, o desenho da “sea thrift”, respetivo nome em inglês. No entanto, se excluirmos os profusos aspetos ornamentais (consultei, entre outros, “Perennials” de Roger Phillips & Martyn Rix e “Botanica’s Pocket” da editora Ullmann), a arméria é muito pouco estudada. Nos livros publicados em português que possuo na minha biblioteca, nada encontrei de relevante.
Contudo, o conceituado “site” norte-americano “Plants for a Future” classifica a planta com o grau 1, quer no que respeita à comestibilidade (folhas e raízes), quer no tocante ao seu poder curativo, sem entrar em pormenores. Noutro “site” diz-se que as flores secas têm propriedades antibióticas e podem servir para tratar a obesidade e as infeções urinárias. Acrescenta, no entanto, que utilizadas externamente, podem causar irritação na pele e dermatite.
É pouco no que se refere à fitoterapia e não sabemos se é inteiramente fiável. Fica, não obstante, este ligeiro lamiré para que os meus amigos catedráticos entendidos na matéria, possam corrigir, completar e enriquecer a modesta croniqueta, que ora redijo, sobre uma ervinha bravia que me despertou basta simpatia.
Miguel Boieiro
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