No tempo do tomate não há más cozinheiras” foi o mote que serviu de base a mais uma Tertúlia Gastronómica na Associação de Cozinheiros Profissionais de Portugal, no passado dia 27 de setembro, em que eu tive a oportunidade de assistir, para a qual foram designados os seguintes oradores: Maria de Lourdes ModestoGastrónoma Portuguesa – e Edgardo PachecoJornalista e Escritor –, para além de Vírgílio Nogueiro GomesGastrónomo e Investigador em História da Alimentação.

Afinal de contas, o tomatedeverá ser classificado como uma frutaou como um legume? Para responder a esta questão, vamos analisar primeiro qual é que é a verdadeira parte da planta que costumamos ingerir.

Normalmente, as plantas crescem a partir de sementes produzidas no seu próprio interior, através do seu órgão, o ovário, que mais tarde dará origem ao fruto, servindo até para proteger as sementes, em que, por exemplo, no caso da maçã, a parte comestível é exatamente a parte envolvente ao do ovário que contém as sementes.

Ou seja, tecnicamente, tudo o que tem semente é um fruto, tal como acontece com o tomate, sendo a palavra legume usada antes para as outras partes comestíveis de uma planta: as folhas (alface), as flores (brócolos), os caules (aipo), os tubérculos (batatas), os bolbos (cebola) e as raízes (beterraba).

Mas, apesar disto tudo, o tomate é muitas vezes consumido como um legume, já que por outro lado também contém um teor de açúcar muito mais baixo do que as frutas em geral.

O tomatepertence à família das solanáceas, onde também se encontram a batata, a beringela, o tabaco, o pimento, a petúnia, a mandrágora e a beladona, tendo surgido primeiro na América, para depois, na altura dos Descobrimentos, por volta do século XVI, ter conseguido chegar até nós. Mas atenção que algumas espécies dessa mesma família Solanaceae são consideradas venenosas (mandrágora e beladona), levando a que, numa primeira fase, os europeus não reagissem muito bem à adoção do tomate nos seus preparos culinários, logo começou por ser cultivado somente como planta ornamental nos jardins. 
Na verdade, a intitulada “maçã do amor”, que é como lhe chamam os franceses, por lhe atribuírem propriedades afrodisíacas, possui muita versatilidade, sendo muito utilizada em saladas, sopas frias, molhos, cocktailsou doces. Nutricionalmente, o tomate é rico em antioxidantes, vitaminas A e C, bem como licopeno, sendo este responsável pela sua cor e com benefícios cientificamente provados a vários níveis: prevenção de vários tipos de cancro, fortalecimento do sistema imunitário, prevenção de doenças cardiovasculares e neurodegenerativas e protetor da pele, diminuindo os efeitos dos radicais livres.

E se, por um lado, existem cerca de 700 variedades de tomate de salada, variando entre o mais doce e o mais ácido, entre o mais aromático e o menos intenso e entre o vermelho e o riscado, por outro lado, segundo Edgardo Pacheco, Portugal ocupa o 3º lugar no ranking europeu da produção de tomate de indústria, a chamada polpa que depois costuma ser trabalhada noutros países que se dedicam à transformação da mesma em diferentes moldes.

O tomate Coração-de-Boi, por exemplo, é um tomate de frutos grandes, vermelhos, muito tenros e lisos, sendo dos melhores para comer cru, por terem pouca semente e serem muito carnudos e saborosos.

No que diz respeito às condições climatéricas ideais, o tomate é um tipo de fruto bastante sensível, devendo-se ter em conta um certo número de variáveis: uma cultura de tomate é muito exigente quanto à quantidade de luz, todavia deve-se ter cuidado com o número de horas de exposição solar de forma contínua, bem como com os períodos de calor intenso de forma constante. 
Antigamente, também se procurava fazer sempre uma seleção dos melhores frutos, a fim de serem reutilizados como sementes nos anos seguintes, dando origem a uma certa proteção genética do próprio fruto. Mas com a facilidade de deslocação ao longo dos tempos, os proprietários deixaram de estar obrigados às longas permanências nas suas quintas e daí o declínio das hortas, tendo quase desaparecido a figura do chamado “hortelão”, em que era alguém que a tempo inteiro cuidava da produção de frutas e legumes. Felizmente, parece que as hortas estão hoje a ressurgir, apoiadas sobretudo no aumento do turismo em Portugal, fazendo com que muitas das quintas se transformem novamente em locais de residência permanente.

E é por finais de agosto, a anteceder as vindimas, que os tais tomates Coração-de-Boi costumam dar o melhor de si: mais vermelhos, carnudos, suculentos e de aroma incontornável. Com temperaturas extremas, solos pobres e xistosos, este tipo de tomate definitivamente encontrará nas encostas ensolaradas do Douro as condições naturais ideais para crescer e se multiplicar, com a útil propriedade de retenção da água.  
Desta forma, a verdadeira qualidade desse mesmo tipo de tomate é ainda mais notória aquando do momento de corte, que tal como Maria de Lurdes Modesto tão bem defende, deve ser com uma faca de serrilha, devido à sua própria textura aveludada, bem como aquando do momento de degustação, em que se nota claramente uma quantidade de açúcar considerável em cada garfada.

«O Concurso Tomate Coração de Boi do Dourosurgiu de conversas entre três amigos, um produtor de vinhos, Abílio Tavares da Silva, da Quinta de Foz Torto, um jornalista, Edgardo Pacheco, e uma ex-jornalista, Celeste Pereira, da empresa de comunicação Greengrape.  Apreciadores sem notas de rodapé do tomate que se produz nas hortas das quintas do Douro, quiseram dar-lhe a merecida notoriedade e meteram mãos na organização de um concurso que é uma homenagem ao fruto suculento e carnudo e à perseverança de todos o que teimam em manter as hortas de quinta no Douro.» (texto retirado da página do Facebook Tomate Coração de Boi do Douro)

Para finalizar, a somar-se à receita por mim descrita neste blog de “Doce de Tomate”, apresento-vos abaixo duas ótimas receitas da autoria de Maria de Lurdes Modesto:
  •  tomate “confitado”: corte tomate carnudo (o chamado maçã) em gomos e coloque-os num tabuleiro; regue com azeite, polvilhe com flor de sal e espalhe por cima algumas hastes de tomilho ou de manjericão; cubra com folha de alumínio e leve a forno muito brando (120ºC) durante 3 a 4 horas ou até o tomate se apresentar enxuto, mas não seco; conserve no frigorífico coberto de azeite; aplique, entre muitas outras coisas, em sanduíches de queijo fresco, ou maduro amanteigado.
  • vinagreta de tomate a usar em massa e arroz cozido, salada de pepino, etc.: 8 tomates grandes e maduros, 5 dl de azeite virgem extra; 2,5dl de bom vinagre de vinho tinto; 1 boa colher de sopa de mostarda de Dijon, 1 colher de chá de açúcar, sal e pimenta preta do moinho, a gosto; bata tudo no copo misturador e passe por um passador de rede; conserve no frigorífico por 5 dias.
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2 Comments

  1. Mónica Rebelo 18 Outubro 2018 at 22:23

    Realmente, o tomate é um produto do tipo bastante versátil, podendo fazer-se com ele: um doce, uma bebida, um prato principal, um molho, uma salada…seja ele cozido, frito, grelhado, estufado ou crú! Beijinhos!
    Mónica Rebelo do blog Cozinha Com Rosto!

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